TESTEMUNHAR JESUS ENTRE LAGARTAS E BORBOLETAS
Incomodam uma
barbaridade. Não há hortelão que não se irrite com elas. E elas surgem
inesperadamente... primeiro uma, depois duas... e logo são dezenas, centenas...
incontáveis! Parecem estar brincando em meio aos canteiros com verduras no
quintal de nossa casa.
Eu gosto de
borboletas! Elas são lindas, têm tamanhos variados, são multicolores e
silenciosas... Sobrevoam saltitantes de planta em planta. No entanto, passados
alguns dias, o resultado daquela dança se revelará nefasta, destruidora,
invasiva: uma multidão de lagartas de todos os tamanhos a devorar as folhas
mais tenras das plantinhas. É a chegada do caos... e quase sempre é, realmente,
o fim. As lagartas peçonhentas provocam ânsias e até repulsa no observador mal
acostumado.
Porém, a mãe
natureza preparou uma surpresa. Quando ninguém poderia imaginar, aquelas
repugnantes lagartas vão se protegendo dentro de casulos. E, numa bela manhã
ensolarada, elas eclodem do seu esconderijo e já não lembram mais (nem de
longe) as lagartas que eram: agora têm asas, multiformes e com cores
variadas... Aos poucos vão se acostumando com a nova condição até começarem a
voar.
As borboletas
parecem frágeis, mas elas suportam temperaturas hostis e conseguem viajar
milhares de quilômetros sem um pouso de descanso sequer.
Elas podem nos
ensinar muitas coisas. Somente os simples de coração são capazes de contemplar
a natureza e perceber como Deus, o Criador, vai se comunicando conosco através
de suas criaturas; inclusive através de um punhado de borboletas. Jesus já nos exortava:
“Olhai as aves do céu... as flores dos campos...” (Mt 6,26-28)!
Há momentos na
nossa história pessoal em que queremos um lugar ao sol, ser reconhecidos, ser
respeitados em nossa condição humana e por nossas habilidades. Gostamos que
valorizem nossa presença, nossas opiniões e as escolhas que fazemos. Buscamos,
quase que mecanicamente, ser enturmados, acolhidos no grupo e, muitas vezes,
colocados no centro das atenções. Parecemos aquelas borboletas irrequietas que
se fazem notar, pois saltitam, nos seus voos tresloucados, entre a ramagem.
Nossa sociedade
tem incentivado a vaidade, o narcisismo e o “sobre-si-mesmar-se” (isto é, o
endeusamento de si mesmo). No mundo artístico e desportivo isso parece natural;
e vale tudo para permanecer nas listas dos “mais famosos”, “mais comentados”,
com maior quantidade de “likes” (joinhas nas redes sociais), os mais badalados,
os mais premiados... Há empresários que lucram fortunas promovendo pessoas;
tudo em nome do dinheiro!
Passado algum
tempo, percebe-se o resultado de tanta vaidade: as “lagartas” surgem devorando
tudo!... Absolutamente, tudo! Em outras palavras: vale tudo pelo sucesso!
Assim, os valores da religião, da família, das Instituições... tudo fica
relegado ao segundo plano. A herança recebida e transmitida como valor, de
geração em geração, agora é questionada, menosprezada, abandonada.
Não é isso o que
percebemos, por exemplo, com o advento das ideologias que promovem a
descriminalização do aborto e das drogas?! A destruição dos princípios vitais desnorteia
a sociedade. Quais “lagartas” no quintal, tais ideologias causam repulsa e
desprezo.
Porém, assim
como acontece na natureza, o ser humano tem percebido que o mal pode ser
superado, que o tempo pode resolver muitos problemas, que a paciência profética
também pode ajudar a construir o bem!... Sábias as pessoas que não se
desesperam porque a noite tornou-se de um breu tão espesso e sem luar. Elas
sabem que o sol tornará a raiar na manhã seguinte; é preciso esperar o
alvorecer!
Vivemos tempos
sombrios em nossa sociedade. No mundo da política, por exemplo, quase já não
vemos luz... às vezes, nem no fim do túnel. Nossos relacionamentos têm revelado
que precisamos nos amar mais, nos valorizar mais, nos respeitar mais!
Assassinatos,
roubos, corrupção, mentiras... tudo contribui para que desanimemos na
caminhada. É quando a luz da fé vem nos iluminar: “Vós sois todos irmãos”,
disse Jesus, como lembramos na Campanha da Fraternidade (Mt 23,8). É como
costumamos cantar: “Onde o amor e a caridade, Deus aí está” (cf 1Cor 13).
Nós, cristãos,
já sabemos que a vida pode renascer do nada, “das cinzas”. Jesus rompeu o lacre
que o prendia no túmulo funerário. O sepulcro está vazio! “Ele não está aqui;
ressuscitou!” (Mt 28,6). Nós somos testemunhas d’Ele, do Cristo vivo, o
Ressurreto, o que vive para sempre!
São Paulo
escreveu: “agora vemos tudo como que por um espelho, de maneira confusa... mas,
depois, veremos face a face..” (1Cor 13,12).
Nós conhecemos as “lagartas” do dia-a-dia, mas também lembramos das
promessas de Jesus: “No terceiro dia, Eu ressuscitarei” (cf Lc 18,33)! Nem para
os Apóstolos foi fácil “ficar sem Jesus”!
Mas, naquele
Domingo, “o primeiro dia da semana”, uma alegria tomou conta do coração de
todos, e eles saíram a anunciar o Evangelho, animados pelo Espírito Santo.
Pentecostes! Passou o tempo do medo, da desesperança, das inverdades recobertas
com “pele de cordeiro”. As “lagartas” se tornaram borboletas muito lindas e
divertidas, voando e sobrevoando toda a verdura do quintal.
Eis uma singela
metáfora da Ressurreição do Senhor. É preciso que percebamos o sentido das
várias fases da vida e dos acontecimentos. Jesus compartilhará sua vitória com
os seus amigos (cf Ap 3,20-21).
Esse mesmo
exemplo nos faz pensar sobre tantos irmãos que deixamos à margem de nossa
história, quais lagartas desprezíveis. É tempo de acolher, de bendizer! Deus
está agindo em nossas vidas. Ele pode transformar meras lagartas em borboletas.
E saberá nos ajudar a superar nossas cadeias e prisões. Enfim, o desespero do
hortelão será transformado em espetáculo da Criação!
Pe. Auricélio
Costa
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