Vivenciar e anunciar a Misericórdia que restaura

Um conhecido meu levou seu carro ao chapeador para fazer umas “coisinhas” na lataria. Chapeador é aquele profissional que resolve problemas na lataria do automóvel. Lá chegando, o homem observou o veículo do cliente e disse “aqui há muito o quê fazer: há sinais de ferrugem e amassados em vários lugares do carro: no assoalho, na lataria, nos para-lamas, no capô... você vai querer fazer tudo ou dar uma ‘tapeada’ ou deixar como está?”.
Essa situação é muito mais comum do que se pensa. Mas não é sobre reforma de automóveis que iremos tratar aqui. Em muitos aspectos da vida da gente, vez por outra, se apresentam situações em que precisamos decidir: ou resolvemos ou enrolamos ou ficamos indiferentes.
Neste Ano da Misericórdia, que já expirará no próximo dia 20 de novembro, de muitas formas Deus tem nos convidado a nos permitirmos uma “restauração geral”. E é somente Deus Misericordioso Quem pode fazer esta empreitada: pois Ele conhece plenamente o coração humano, sabe de suas possibilidades e tendências, e não se cansa de propor um ‘reparo transformador’.
Não dá pra negar que o homem moderno tem encontrado soluções para muitos problemas: máquinas automotoras e informatizadas que o ajudam nos trabalhos mais pesados e nos de maior precisão; descobertas de novas enfermidades e algumas soluções para elas; avanços tecnológicos em todos os setores da cadeia produtiva...
Também é óbvio que o advento do Terceiro Milênio ainda não trouxe a solução para problemas muitos corriqueiros: doenças antigas que ainda matam (gripe, sarampo, malária, câncer...); desafios da desigualdade social (exclusão, novos párias, refugiados, fome...)...
Mas a grande dor que vem fazendo o homem sofrer é a perda do sentido de viver! Cada vez mais aumenta o número das pessoas que procuram abreviar ou antecipar o fim de suas vidas, ou que vegetam mergulhadas em suas tristezas patológicas. Um desalento tem tomado conta de muitos corações.
Diante desta realidade o Papa Francisco clama e grita: “A Alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixar salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus renasce sem cessar a alegria!” (Evangelli Gaudium 01). E insiste no convite: “convido todo cristão, em qualquer lugar ou situação que se encontre, a renovar hoje mesmo o seu encontro pessoal com Jesus Cristo... já que da alegria trazida pelo Senhor ninguém é excluído” (EG 03).
É muito fácil perceber que o ser humano está precisando urgentemente de uma “restauração”. Ele anda triste, violento, acuado, pessimista e depositando suas esperanças em futilidades. Tem inventado deuses e religiões que não podem salvá-lo. Tem rejeitado seus filhos e “não chora, nem guarda luto” quando estes morrem. O homem e a mulher hodiernos andam “enferrujados”... morrendo tristemente aos poucos.
Ainda é Francisco quem nos mostra uma luz: “Fomos concebidos no coração de Deus e, por isso, (cita Bento XVI) ‘cada um de nós é o fruto de um pensamento de Deus. Cada um de nós é querido, cada um de nós é amado, cada um de nós é necessário’” (Laudato Si’ 65). E explica: “a existência humana se baseia sobre três relações fundamentais intimamente ligadas: as relações com Deus, com o próximo e com a terra. (...) estas relações romperam-se não só exteriormente, mas dentro de nós... é o pecado” (LS 66).
Diante desta realidade, inspirados pelo Jubileu da Misericórdia, podemos acolher este dom maravilhoso que Deus nos oferece: restauração! É por pura Misericórdia que Ele restaurou inúmeros pecadores das Escrituras: Moisés, Abraão, Jacó, Salomão, Davi, Jonas, os apóstolos, Madalena, o bom ladrão... e toda a humanidade, inclusive eu e você!
Deixemos o Espírito Santo agir em nós! É como cantam nossos jovens naquela canção da Banda Vida Reluz: “Cristo quer fazer em mim uma obra nova e o meu coração quer modificar”! Portanto, com relação à sua vida e ao mundo, como responder à pergunta do chapeador: “vai querer ‘restaurar’ tudo ou dar uma ‘tapeada’ ou deixar como está”?



Pe. Auricélio – Pároco e Reitor do Santuário

Postar um comentário

0 Comentários