URGE CANTAR COM O CORAÇÃO ARDENTE



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No meio da gravação de uma canção, ele me interrompeu e explicou: “Padre, você quer que eu acredite nisto que o senhor está cantando? Então, cante com o coração e não apenas tecnicamente seguindo a melodia”. Era o Diretor Artístico quem falava. Naquela ocasião, no estúdio, enquanto eu preparava um novo CD, sentamos juntos eu o ouvi falar sobre a importância de deixar o coração “cantar”.

Certamente que não foi a primeira vez que eu lidava com este tema. Mas, vez por outra, é importante refletir sobre a caminhada da gente. Pois, dotados com uma “vocação santa” (2Tim1,9) e tornados “discípulos missionários” de Jesus Cristo, cada batizado tem uma razão para sua existência: viver para Cristo, para instaurar o Seu Reino de Amor e de Justiça.

Sabemos que existem professores e professores, médicos e médicos, padres e padres... e assim por diante. Tecnicamente o professor precisa ter alguns atributos para bem exercer a sua bela profissão. Mas ele se torna uma referência para os demais quando sabe aliar aos seus conhecimentos científicos outros dados muito importantes: sua experiência de vida, seus valores, sua dedicação integral, quando se sente educador não apenas na sala de aula, seu compromisso social, quando busca novos métodos e conhecimentos... Existem muitos professores assim!

Em cada profissão encontraremos pessoas que conseguem “fazer a diferença” e se sobressair do parâmetro mínimo exigido.

Transpondo para a vida cristã, também haveremos que encontrar batizados que vivem sua fé com grande comprometimento, permitindo que ela permeie todos os meandros da sua vida. Para estes fiéis, religião não é apenas um conjunto de ritos, normas e obrigações... tampouco algo meramente tradicional, sem envolvimento pessoal e emocional.

Quando penso no esforço que certas pessoas fazem para poder participar de uma Santa Missa, ou para adorar o Cristo num dia de Corpus Christi... e no quanto se dedicam no cuidado amoroso de enfermos ou de idosos ou na promoção da vida... concluo que a fé é mesmo um dom que “remove montanhas”.

É preciso que vivamos nossa fé com renovado ardor! É o apóstolo Pedro quem nos exorta: “Sobretudo, cultivai o amor mútuo, com todo o ardor!...” (1Pd 4,8). O adjetivo qualitativo “com todo o ardor” não é apenas uma ilustração literária. É um indicativo de que o cristão deve viver plenamente o Amor. O amor não pode ser “pequeno” ou “insuficiente” ou “comedido”. O amor é Amor e pronto. Por isso, no mesmo versículo lemos: “porque o amor perdoa uma multidão de pecados”! Ele provoca um novo jeito de lidar com as coisas do dia-a-dia, a forma de perceber os relacionamentos... O amor provoca conversão!

Podemos recordar São João: “Foi Deus quem nos amou primeiro” (1Jo 4,19). Sim, pois “Deus é amor: quem permanece no amor, permanece em Deus e Deus permanece nele” (v.16). S. Pedro ensina que o cristão é marcado pelo amor: “com ardor e de coração sincero amem-se uns aos outros” (1Pd 1,22b). Portanto, ser cristão é ser morada de Cristo, testemunha d’Ele, íntimo do coração d’Ele... vocacionado para amar “como Jesus nos amou” (cf Jo 13,34).

A nossa sociedade duvida de nossa fé, suspeita de nossa doutrina, descrê de nossas verdades e desdenha a nossa religião. O poeta alemão Bertolt Brecht (+1956) assim olhava para este mundo: “Realmente, vivemos tempos sombrios! A inocência é loucura. Uma fronte sem rugas denota insensibilidade. Aquele que ri ainda não recebeu a terrível notícia que está para chegar.” E o sociólogo polonês Zygmunt Bauman (+2017) explicava que “vivemos em tempos líquidos. Nada foi feito para durar!... A modernidade líquida é um mundo repleto de sinais confusos, propenso a mudar com rapidez e de forma imprevisível”.

Em meio a tantos desafios, talvez necessitemos deixar que o Cristo que habita nosso ser fale mais “pra nós” (e não apenas para os outros); que Ele aja através de “nossas mãos” para acolher e abraçar e acalentar os que de nós se aproximam; que Ele mova “nossos pés” em direção às realidades desafiadoras que existem aqui no nosso bairro, ou na nossa família... que Ele abra “nossos olhos” para percebermos além das aparências, além do horizonte, além do óbvio e presumível.

Certa vez um homem de Deus, o profeta Elias, juntamente com o seu povo, teve que enfrentar uma grande miséria por conta da prolongada estiagem. O trabalho do campo, plantações e animais... tudo foi comprometido. Mas um dia, no terraço, ele disse ao servo: “olha no horizonte para ver se há nuvens se formando”. A resposta foi negativa por seis vezes. Elias mandou o servo observar o horizonte pela sétima vez; aí, sim, o servo disse: “há uma nuvenzinha, mas muito pequenina”. Foi o suficiente para que o homem de Deus mandasse avisar o rei Acab que a chuva estava chegando (1Rs 18,41-46).

Para o homem de fé bastou um pequeno sinal, que foi buscado com perseverança e confiança, para contemplar uma realidade que ainda não era perceptível para as demais pessoas. A fé verdadeira faz a diferença na vida do cristão. Ela é capaz de iluminar a vida do crente de dentro para fora.

Jamais esquecerei aquela experiência vivida no estúdio. “Cantar com o coração!...” para que ou outro acredite e acolha a mensagem. Movidos pela fé, com todo o ardor que o Espírito Santo suscita em nós, sejamos testemunhas do Amor!... Cristãos que fazem a diferença. E a diferença é amar como Jesus!

Diocese em Foco – Julho de 2018

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