CONSCIÊNCIA FRATERNA – CONTRA O ESFRIAMENTO INTERIOR


 
Toda estação do inverno é assim: muitas pessoas ficam ouriçadas para ver a neve cair nas cidades mais altas da nossa região. Caravanas de todos os lugares se dirigem para a Serra almejando ver a neve, brincar de construir bonecos de gelo, bebericar o chocolate quente e a preciosa aguardente... É uma festa em meio ao frio intenso que parece fazer parar a respiração. Quem consegue se fotografar em meio à neve ostenta suas fotos nas redes sociais como troféus. Mas ninguém vai sozinho apreciar o fenômeno invernal. Grupos grandes ou pequenos de pessoas se reúnem, se congregam e festejam as baixas temperaturas. O que as aquece? O fato de estarem juntas, a emoção de ver os flocos de neve... a alegria as mantém aquecidas!
Neste tempo em que muita gente – até intelectuais e religiosos – fala de esfriamento espiritual é importante perceber como, na essência, o ser humano permanece uma criatura social, dado à vida em grupo e carente de encontrar-se com os demais semelhantes.
Em si, estar sozinho não significa estar isolado, indiferente e auto-excluído. Pois o ser humano também precisa de se encontrar consigo mesmo, de escutar suas vozes interiores, de olhar para dentro do seu coração, de perceber seus movimentos interiores, de conhecer-se melhor, de identificar e curar suas machucaduras... enfim, tempo para estar consigo e amar-se mais e mais.
Também andamos carentes de elevar nossa auto-estima e de “recordar” o sonho de Deus ao nos criar como filhos: a nossa felicidade. Ao longo da jornada neste mundo, acumulando anos de vida, vamos nos ocupando com tantas coisas que acabam sugando de nós tamanha energia vital que já não nos conhecemos direito. Somos capazes de buscar “sinais ou indícios” de vida em outras galáxias, mas não conseguimos penetrar no nosso coração. Tampouco conseguimos resolver nossas dificuldades de relacionamento inter-pessoal.
As verdadeiras guerras entre países (mesmo que apenas no nível das ameaças e da ostentação de poder bélico) indicam que o ser humano ainda não se descobriu como filho de Deus. E, consequentemente, não consegue perceber que também o outro “brotou” do mesmo e único Coração Divino. Essa consciência fraterna poderia evitar inúmeras guerras fratricidas, étnicas, religiosas...!
Nossas “guerras” interiores têm trazido muita tragédia para nossas famílias, nossas comunidades e para toda a sociedade. As pesquisas constatam o aumento da violência contra os outros e contra si mesmo (suicídio, auto-mutilações, drogadição...) que têm a sua raiz neste descalabro interior. Daí o descaso com a pessoa alheia, o indiferentismo religioso (e ateísmo), a apatia política, o egocentrismo autodestrutivo e a fuga da realidade. As campanhas de valorização da família, da vida comunitária, da vivência dos valores religiosos... têm aqui grande importância para ajudar o ser humano a redescobrir-se filho amado de Deus e irmão dos demais seres humanos.
Quando lemos nos Atos dos Apóstolos a descrição das primeiras comunidades ficamos impressionados com o ideal que cultivavam e que nos deixaram como legado: “tinham os mesmos sentimentos...”, “um só coração e uma só alma” (cf At 1,14; 4,32). Em meio às dificuldades e contradições que obviamente enfrentavam, a fé no Cristo Ressuscitado presente as impulsionava para continuarem unidas e congregadas. Os séculos passaram e, nestes nossos tempos, ainda somos desafiados a construir comunidades unidas no Cristo vivo!
A fé nos aproxima de Deus, de nós mesmos e dos irmãos e irmãs! A fé é dom de Deus que pode nos aquecer neste “inverno”. Precisamos suplicar que o Senhor nos cumule deste dom divino como fizeram os apóstolos ao ouvirem Jesus ensinando sobre a vida fraterna: “aumentai a nossa fé!” (Lc 17,5). E insistir como Ele mesmo nos exortou: “pedi e recebereis” (Mt 7,7). E, com humildade, reconhecer: “Creio, Senhor, mas aumentai a minha fé” (Mc 9,24).
Que nesta estação – a mais fria do ano – o Senhor nos aqueça com seu Amor e possamos ver em nós e nos outros a Sua Presença. Que o sol da fé não permita que fiquemos congelados e estáticos diante dos desafios missionários de nosso tempo. Aqueçamo-nos uns aos outros, uns com os outros... e todos juntos no Amor de Deus!


Pe. Auricélio Costa

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