No início da década de 60 o Brasil
inteiro cantarolou o jingle da
campanha eleitoral que elegeu Jânio da Silva Quadros o 22º Presidente do país.
O mote dizia “Varre, varre vassourinha! Varre, varre a bandalheira! Que o povo
já tá cansado de sofrer
dessa maneira!”. Ele
governou nossa nação por oito meses em 1961, quando renunciou.
Nestes tempos
sombrios pelos quais vai atravessando nosso país, as notícias de corrupção e
desmandos vão tomando conta de nossos noticiários diuturnamente, e em todas as
formas midiáticas. O sentimento de impotência se mistura ao de indignação
ética. Sentindo-nos roubados e abandonados o tempo todo pelas instituições,
vamos mergulhando num ostracismo ou pessimismo que gera desesperança.
Como rezar,
como fazer um louvor, como anunciar o Evangelho, o quê apresentar diante do
altar... diante desta realidade social tão caótica e desafiadora?
Pois bem, o
Cristo de nossa fé é o mesmo Jesus histórico que viveu num contexto social
talvez ainda pior do que o nosso. Israel era vassalo cego de Roma e
subserviente aos poderosos de toda a região. Os bens da nação ficavam
concentrados nas mãos de um grupelho que governava as regiões, sob a bênção do
Imperador romano. Fome, desemprego, violência, imoralidades, perseguições e
desalento também apontavam para um futuro tenebroso.
Foi neste
contexto que Jesus surgiu falando do Reino do Céu e dos sonhos de Deus para
seus filhos e filhas na Terra. Dizia-lhes: “Eu vim para que todos tenham vida e
a tenham em abundância”. Ensinava o caminho do amor ao próximo: “amai-vos uns
aos outros... perdoai quem vos ofendeu... orai uns pelos outros...”; e
garantia: “recebereis um grande tesouro no céu”. E exortava: “o Filho do Homem
não tem onde reclinar a cabeça... Mas todo poder Me foi dado do alto... Quem
cumpre as minhas palavras, esse é meu amigo”.
Jesus ajudava
seus discípulos a perceberem como Deus cuida das plantinhas, dos passarinhos,
das sementinhas... e como em toda a natureza está presente a mão do Pai. Seus
ensinamentos e seus gestos ajudavam os seus seguidores a olharem ao seu
derredor com um novo olhar... um olhar de encantamento!
E eles foram
observando: os lírios do campo, o orvalho da manhã, a galinha com seus
pintinhos, as nuvens no horizonte, os rebentos da plantação, os passarinhos do
céu, os rebanhos de ovelhas nas montanhas, a mãe que acabou de dar à luz, o
andarilho que é abraçado, o coxo que agora pula e corre, a mulher que louva a
Deus por ter sido curada e libertada dos maus espíritos... Assim, Jesus ajuda
seus discípulos a perceberem que o Reino de Deus já está presente – e ao mesmo
tempo escondido – em todo o contexto do dia-a-dia.
Nós,
cristãos, precisamos retomar o Evangelho, aproximando-nos da Pessoa de Jesus,
para podermos atravessar o atual período histórico nacional. Caso contrário,
seremos mais um a reclamar, a se revoltar contra os desafios da realidade, mas
não conseguiremos propor nada de novo. E o novo é a vida!... a vida fundada na
fé!
Isso
significa redescobrir a beleza de viver cada dia, de estar com as pessoas, de
poder respirar e tomar um copo de água fresca! É preciso sorrir, ouvir e
cantar! É preciso fazer um carinho no filho, rir com as suas peripécias e até
rir-se de si mesmo! Deus está caminhando conosco! Ele não nos abandonará! “Eis
que Eu estarei convosco todos os dias, até os confins dos tempos!”,
assegurou-nos Jesus.
É preciso
atravessar esse mar agitado como homens de fé, certos de que estão como o
Senhor, mesmo que Ele pareça estar “dormindo” ali no convés. Isto é, mesmo
quando Sua ação não parece tão evidente e cristalina. Ele que cuida dos pardais
(“que são vendidos por duas moedas”), que conta os fios de cabelo de nossa
cabeça e “veste” com esplendor as florzinhas silvestres... Certamente, não
abandonaria um filho amado, criado à Sua imagem e semelhança.
Sim, é
preciso “varrer” toda “bandalheira”, como rezava aquela cançoneta do Jânio
Quadros. É preciso fazer valer a Justiça, com ética, com respeito ao ser humano
em toda a sua integralidade! É necessário que cada brasileiro faça a sua parte,
“varrendo” o pessimismo do seu coração; mas também seus interesses gananciosos,
atitudes de espertalhões e sangue-sugas, desejo de enriquecimento a todo custo
e maquiavélico!... É preciso “varrer” toda a sujeira que desfigura o rosto do
ser humano.
Temos andado
muito longe dos planos de Deus e o resultado está aí, diante de nossos olhos. A
limpeza que precisa ser feita pode começar a partir de nós mesmos: contemplando
os dons de Deus em nossa vida e na vida dos irmãos, buscando a sobriedade e a
beleza da simplicidade, recuperando o bem-querer aos outros!... A palavra de
Jesus é a certeza que acompanha o cristão em sua caminhada: “Coragem! Eu venci
o mundo!”.
Pe. Auricélio Costa - Publicado No Jornal Diocese em Foco - Junho/2017
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